Uma história sobre sonhar com um Tsunami.

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Imagem do site pixabay.com

No dia 27 de janeiro de 2022, numa quinta-feira, acordei de supetão na madrugada assustado por um pesadelo… A sensação era de terror, medo, angústia e uma percepção real de desespero que me impediu de voltar a dormir. Por mais estranho que pareça eu tive o mesmo pesadelo por ângulos diferentes e nos três dias subsequentes, ou seja, também na sexta, no sábado e no domingo… Eu me chamo Sidney, tenho 52 anos, trabalho como advogado, e vou contar pra vocês o que este sonho despertou em mim há seis meses…

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Depois de quatro dias sonhando com um tsunami invadindo meu bairro e minha casa, eu decidi que precisava entender o que estava acontecendo. De início, a primeira coisa que fiz foi pesquisar na internet sobre o significado do sonho e encontrei diversas explicações que pra mim não fizeram muito sentido, a maioria tinha um teor espiritualista o que me deixou bastante incomodado, então, por conta de alguns textos que li ao longo dessa busca, decidi procurar ajuda psicológica pra lidar com a seguinte questão:

“As imagens que eu via no sonho se repetiam em minha mente… Toda vez que deitava pra dormir novamente via as ondas vindo em minha direção e eu começava a me sentir angustiado e com os pensamentos acelerados, depois o sono sumia e só retornava lá pra umas cinco da manhã”.

Então, por conta disso eu entrei em contato com um psicólogo e agendei a primeira consulta. Nunca pensei que frequentaria o consultório de um profissional dessa área, para mim ir ao psicólogo sempre foi sinônimo de maluquice, mas cheguei ao nível de não pregar os olhos por três noites seguidas e me senti tão mal que ou eu ia nessa consulta ou eu acabaria enlouquecendo…

A experiência foi positiva… já na primeira sessão o profissional foi simpático comigo… Ele me perguntou o que me lavava até ele e foi muito atencioso. Lembro de pedir muitas desculpas por relatar o que estava acontecendo e ele muito solícito acenava com a cabeça e pedia pra eu continuar a explicar da melhor forma que conseguisse. Como os sonhos foram o pontapé para tudo o que eu estava sentindo, ele pediu pra eu narrar as imagens e assim o fiz…

O primeiro sonho que tive foi assim…

Eu sonhei que estava sendo perseguido por um tsunami, digo perseguido porque a onda vinha a meu encontro no sentido de alcançar minha casa. Eu lembro de no sonho estar dormindo no período da tarde, de acordar lá pra umas 16h e ir até a varanda ver como estava a cachorrinha da minha mãe e também estender uma roupa que minha esposa havia deixado lavando e pedido pra colocar na corda. Nesse momento, eu percebo o quanto ventava porque ao redor da varanda minha mãe havia colocado uma cortina plástica para que a água da chuva não molhasse o chão e com o vento elas faziam barulho e se moviam. Ao ver as cortinas balançando muito, lembro de olhar para o horizonte, em direção ao começo de meu bairro e também na direção da entrada da cidade, e ver muita água vindo em minha direção.

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A água parecia muito alta, mas não chegava a ser uma grande onda, é como se ela já tivesse sido quebrada longe, ainda na costa do mar e estava apenas se espalhando com força, velocidade e capacidade destruidora de tudo que encontrava. Eu vi as ondas e me senti aterrorizado, como se aquela situação representasse o fim da minha vida, e o fim de minha família. Eu tive medo, insegurança, eu chorei rápido, mas corri pra dentro de casa pra buscar minha filha que dormia na cama. Lembro de pegá-lo no colo e ficar por uns cinco segundos pensando no que levaria para protegê-lo, se uma colcha, um edredom, um lençol, um casaco, ou qualquer outra coisa que pudesse garantir sua segurança… Eu não obtive a resposta naquele momento tamanha a rapidez em que tudo acontecia e acabei pegando um edredom que estava ao lado e sai correndo com ele para um morro que ficava próximo de minha casa. Lembro que a rapidez era tão grande que eu não tive forças pra subir as escadas entre minha casa e a rua que dava acesso ao morro, e uma vizinha me ajudou empurrando-me para que eu pudesse pegar impulso e conseguisse sair do terreno de casa e alcançar um lugar mais alto. Estando já na parte alta do tal morro, eu olhava pra baixo e via a água se aproximando… ela vinha com muita força, sacudindo, empurrando os muros e as paredes das casas, arrastando os carros, as árvores e tudo o que ficava a sua frente. A imagem simbolizava muita destruição e ao mesmo tempo muita força e todo espaço atingido pela água se tornava um nada na vida, como se aquilo não significasse mais nada porque ela havia tomado conta de tudo… Eu percebi que tudo estava ficando pra trás, inclusive a cachorrinha que eu não tive tempo de salvar, na verdade, em meio à correria eu simplesmente esqueci dela e me cobrei muito por isso alguns minutos depois. A água chegou próxima a mim e alcançou minha casa…  Lá do alto do morro eu via toda aquela devastação com minha filha nos braços e me sentindo impotente. Muitos cães surgiram nadando e nesse momento eu estava preocupado com a cachorrinha e chorava muito tentando ver se ela estava entre os que conseguiam se segurar em algum lugar. Senti uma espécie de tristeza com desespero e um sentimento de impotência… Depois disso a água se estabilizou… e a gente viu que poucas pessoas conseguiram subir e se salvar. Eu me vi como se fosse uma criança novamente e de mãos dadas com minha filha assistia a devastação de tudo… Foi terrível.

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Após esse relato o psicólogo perguntou como era sentir tudo o que eu relatei no sonho… ele queria saber como era perceber aquelas sensações no corpo, como eu lidava com elas, o que eu fazia quando sentia tudo aquilo. E pensando na resposta eu descobri que eu havia sentido aquilo tudo mesmo, tinha sido real, apesar de ter sido fruto de um sonho. Fiquei explicando pra ele, mas em paralelo pensando comigo mesmo “que coisa esquisita, ele tem razão, eu senti tudo aquilo…”.

Assim começamos meu processo terapêutico, falando sobre esse sonho, sobre os desdobramentos dele e o que eu pensava, sentia e como eu me comportava em relação a ele. Eu me dei conta que fugia sempre de todos os sentimentos porquê de verdade não sabia lidar muito bem com minhas emoções. Desde pequeno eu fui ensinado a fingir que não sentia, a não chorar, a sempre me mostrar forte e seguro, e isso era tudo o que eu não vivi naquele sonho.

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Então, a parte marcante do início de minha terapia foi entender que eu sentia coisas, que eu guardava muitas delas, e que eu estava vivendo um momento em que muito conteúdo dentro de mim estava bagunçado, agitado, e precisando se organizar. Eu comecei a pensar que as ondas viam me avisar que eu não estava tão tranquilo quanto pensava e que a pausa para ir à terapia era para entender melhor o que estava acontecendo em minha vida e que aquele momento poderia ser benéfico do ponto de vista emocional.

A verdade é que em apenas uma sessão uma enxurrada de imagens voltou à minha mente… muitos pensamentos que eu elaborava sozinho parece que voltaram à consciência como se eu tivesse ligado um interruptor. Assim, eu comecei a pensar sobre mim, sobre a vida, as coisas que eu andava fazendo, meus sonhos e desejos, tudo estava muito confuso e eu me sentia pequeno e preste a ser carregado pela vida como acontecia com tudo em que as ondas do sonho encostava.

Após uns cinco meses em terapia fui percebendo o quanto vivia preso num passado vivificado em mim e somente por mim. Percebi o quanto minhas insatisfações profissionais que tanto me tiravam a paz estava então começando a me perturbar não somente em alguns momentos de reflexões enquanto acordado, mas agora também dormindo. Eu precisei trazer esse tema à mesa pra conversar comigo mesmo através do intermédio do psicólogo pra entender como agir e como lidar com esse sentimento de fracasso que me assolava toda vez que eu pensava num futuro que poderia ter vivido se tivesse tido a coragem de afrontar meu pai e seguir com o meu desejo de ser um professor de Educação Física.

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Porque esse foi meu desejo desde quando terminei o segundo grau, mas meu pai não aceitou porque dizia que a profissão não tinha futuro. Desde então eu estudei, me formei em Direito seguindo a orientação do meu pai, mas frequento academia querendo estar nesse lugar trabalhando e não somente me exercitando.

A chegada aos cinquenta anos fez esse desejo ficar mais forte e junto o sentimento de fracasso por não ter seguido meu próprio sonho. Com essa idade comecei a pensar na brevidade da vida e como era importante a gente viver o que gosta de verdade…

Era um momento de mudança… de reconstrução, de rever as estruturas de tudo o que havia realizado até ali para talvez seguir por outra direção. Mas eu tinha medo de não conseguir, de criar conflitos desnecessários, de desassistir meus filhos num momento que ambos necessitavam de minha ajuda financeira pra se formarem também, e muitas outras coisas…

Então, depois de alguns meses na terapia eu me dei conta de que o sonho sinalizava na verdade meus pensamentos do momento em relação ao meu passado e presente, eram as coisas que eu pensava sozinho, acordado, que eu guardava pra mim porque dividir aquilo com as outras pessoas parecia ridículo demais pra mim nessa idade.

E ao longo das sessões o psicólogo explicou o quanto os sonhos são manifestações simbólicas do nosso estado emocional e, portanto, o quanto eles podem explicar muito sobre nós. “Os sonhos são como fotografias de como estamos por dentro” e era exatamente assim que eu passei a enxergar aquele momento a medida em que aceitei os pensamentos que rondavam minha mente e como me sentia em relação a eles.

E assim seguimos na terapia, falando sobre meus sonhos, relacionando-os ao meu momento presente, e encontrando formas de lidar com as mudanças necessárias na vida para que eu me sentisse mais tranquilo, menos espremido e cobrado por mim mesmo.

 

Nenhum de meus contos retrata o caso de algum paciente atendido por mim. Trata-se de uma ilustração da vida cotidiana, de histórias que motivam pessoas a procurarem terapia/psicoterapia.

Se quiser falar comigo ou se estiver à procura de ajuda para si ou para alguém entre em contato.

Maicon Moreira
Maicon Moreira
Psicólogo (CRP 05/54280), Doutorando e Mestre em Psicologia pela UFRRJ e Especialista em Psicoterapia Cognitiva. É leitor autodidata da obra do psiquiatra Carl Gustav Jung. Tem interesse nos seguintes temas: Psicoterapia Cognitiva, Psicologia Analítica, Violência Psicológica, Saúde Mental, Memória Social, e Formação do Masculino. Trabalha como psicoterapeuta utilizando abordagem integrativa em atendimentos Online (videoconferência).

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